Em geral, não é possível primitivar uma função. No entanto, continua a haver muitas funções contínuas para o qual a operação é possível, que iremos estudar.
Seja Df⊂R um aberto e f:Df→R. Diz-se que F é uma primitiva de f se F′(x)=f(x), para qualquer x∈Df.
Nesse caso, escreve-se F=Pf ou, também, F(x)=∫f(x)dx e diz-se que f é uma função primitivável.
Qualquer função contínua num conjunto aberto é primitivável.
👉 Uma primitiva não é única. É fácil de obter uma função com a mesma primitiva de f.
Assim, Pf deve ser visto como retornando uma função qualquer, de entre um número infinito de funções, as quais têm a mesma derivada.
Frequentemente, a primitiva é determinada por reconhecimento da derivada. Isto implica que se deve saber muito bem as derivadas das várias funções.
Usam-se várias "técnicas" para determinar a primitiva de uma função, explicadas abaixo.
Propriedades da Primitivação
P(αf)=α(Pf),α∈R, para qualquer função primitivável f.
P(f+g)=Pf+Pg
Fórmula de Primitivação da Potência
Se u é uma função diferenciável em todo o seu domínio tal que uα é diferenciável em todo o domínio de u, então:
P(u′uα)={α+1uα+1log∣u∣se α=−1se α=−1
Esta fórmula resume-se a identificar a função u, a função u′ e a constante α.
Seja f uma função definida num intervalo aberto e F e G duas primitivas de f. Então, F−G é uma função constante, nesse intervalo.
No entanto, isto já não é verdade caso a função esteja definida num conjunto aberto que não é um intervalo. Por exemplo:
f:R\Z→R,f(x)=cosx
Facilmente vemos que a seguinte função, primitiva de f, é limitada:
F:R\Z→R,F(x)=sinx
No entanto, a seguinte função, também primitiva de f, não é limitada:
F2:R\Z→R,F2(x)=sinx+k se x∈]k,k+1[,k∈Z
Conclui-se, assim, que uma função pode ter uma primitiva limitada e outra não limitada, cuja diferença não é, nem de longe nem de perto, uma constante.
Sejam u e v diferenciáveis num conjunto aberto C tais que a função u⋅v′ é primitivável. Então, u′⋅v é uma função primitivável e P(u′⋅v)=u⋅v−P(u⋅v′).
A escolha das funções u′ e v deve ser, se possível, respeitando as condições:
A função u′ deve ser facilmente primitivável
A função v tem que ser diferenciável e é conveniente que a sua derivada conduza a uma expressão mais simples
A função u⋅v′ deve ser facilmente primitivável
Exemplos
Exemplo 1
P(2xlog(x+1))=(x2log(x+1))−P(x2⋅x+11)==(x2log(x+1))−P(x−1+x+11)==x2log(x+1)−2x2+x−log(x+1)==(x2−1)log(x+1)−21(x−1)2+41Aqui, usa-se a divisa˜o de polinoˊmios: x+1x2=x−1+x+11
Podem encontrar exemplos de primitivas por recorrência nas páginas 2 e 3 do PDF da aula 22.
Primitivas de uma Função Racional
Para utilizar esta técnica, é necessário que a função racional seja uma função racional própria, isto é, que o grau do numerador seja inferior ao grau do denominador.
Caso não se verifique, efetua-se a divisão inteira, de forma a obter o seguinte:
Q(x)P(x)=Q1(x)+Q(x)R(x)
A fração Q(x)R(x) já é própria, e Q1(x) é um polinómio, sendo assim fácil de primitivar.
Exemplo
A igualdade abaixo pode ser verificada através do quociente polinomial acima.
Abaixo estão os passos para efetuar a primitivação de uma função racional Q(x)P(x):
Se o grau de P é maior ou igual que o grau de Q, efetuar a divisão inteira para transformar numa função racional própria:
Q1(x)+Q(x)P1(x)
Senão, usar a função racional como está:
Q(x)P1(x)
Fatorizar os fatores de Q(x) na forma
(x−α)mou((x−p)2+q2))m
👉 A segunda notação é usada para descrever pares de fatores complexos (imaginários), em que p é a parte real e q a parte imaginária. Abaixo está um exemplo.
Na prática, não irá ser necessário utilizar esta segunda notação em CDI-I.
Exemplo
x2+4x+5=0⟺x=−2±ix2+4x+5=(x−(−2))2+12)
x4+8x3+26x2+40x+25⟺x=−2±ix4+8x3+26x2+40x+25=(x−(−2))2+12)2Neste caso temos dois pares de fatores −2±i
Decompor os fatores em frações simples, determinando os coeficientes da decomposição, quer pelo método dos coeficientes indeterminados, quer usando métodos expeditos.
Primitivar cada uma das frações simples obtidas, podendo-se recorrer a outras regras aprendidas anteriormente.
Decomposição em Frações Simples
tip
Nos exemplos abaixo usa-se ? em vez de escolher um valor para P(x) para simplificar os exemplos.
Para cada raiz diferente (isto é, de multiplicidade 1) da função Q(x) "separa-se" da seguinte maneira:
(x−a)(x−b)…?=x−aA+x−bB+…
Para cada raiz real de multiplicidade m acrescentam-se m frações simples da forma:
x−αA1+(x−α)2A2+(x−α)3A3+⋯+(x−α)mAm
Para cada par de raízes complexas conjungadas p±qi com multiplicidade m adicionam-se m frações da forma (irrelevante em CDI-I):
Na realidade, não é necessário descobrir o valor das raízes complexas, apenas é necessário saber fatorizar o polinómio. Isto simplifica bastante os cálculos.
Determinar os coeficientes da decomposição
Após decompor a função racional em funções simples, necessitamos de descobrir o valor dos coeficientes de decomposição (A,B,C,…).
Para chegarmos a valores para os coeficientes, necessitamos de reduzir todos os denominadores ao denominador do termo da esquerda, para transformarmos a igualdade numa identidade polinomial.
Podemos confirmar que os cálculos estão corretos pois a seguinte igualdade é verdadeira:
x2+7x+121=x+31+x+4−1
⬇️ Caso este método não seja suficiente para determinar todos os coeficientes, passa-se para o método seguinte.
Método dos Coeficientes Indeterminados
Usualmente já se conhecem os valores de alguns dos coeficientes, sendo este método utilizado para descobrir os restantes (usualmente quando há raízes de multiplicidade superior a 1).
Assim, para os coeficientes que restam, escolhe-se uma das potências de x associadas a esse coeficiente.
Para simplificar os cálculos, normalmente começa-se pela maior potência ou pelo termo constante, se tal for possível.
Tomando como exemplo a identidade polinomial,
3x+1=Ax2+Bx(x−1)+C(x−1)
em que já se sabe que A=4 e C=−1 (pelos métodos expeditos).
As potências x2 e x estão associadas ao coeficiente por determinar, o coeficiente B, pois Bx(x−1)=B(x2−x).
Após transformarmos a função racional em várias funções simples, podemos usar as regras da primitivação para separarmos em várias primitivas. Aqui vai depender de caso para caso, mas no geral, vão-se obter primitivas simples de calcular, pelo menos comparada com a função original.
A aula 22 tem imensos exemplos, da página 6-12, que se recomenda ver também.
Primitivação por Substituição
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Trata-se de um método geral de primitivação, que deve ser usado apenas quando os outros métodos não funcionam.
Fórmula da primitivação por substituição - versão 1
Sejam I,J⊂R dois intervalos abertos e φ:J→I uma função bijetiva e diferenciável com derivada não nula em J. Seja, ainda, f:I→R uma função em I. Então, se (f∘φ)⋅φ′ é uma função primitivável em J, f é primitivável em I e
P(f)=[P((f∘φ)⋅φ′)]∘φ−1
👉 Esta notação fica mais fácil de compreender com o exemplo abaixo.
Fórmula da primitivação por substituição - versão 2
Sejam I,J⊂R dois intervalos abertos e φ:J→I uma função bijetiva e diferenciável. Seja, ainda, f:I→R uma função primitivável em I. Então, (f∘φ)⋅φ′ é uma função primitivável em J e
P(f)=[P((f∘φ)⋅φ′)]∘φ−1
Esta fórmula tem um resultado semelhante, mas com condições levemente diferentes (nomeadamente elimina a restrição de a derivada de φ não se anular).
Exemplo
P(x+11)
Utiliza-se uma mudança de variável x=φ(t)=t2, com t>0, para haver injetividade.
P(t2+11⋅(2t))=P(t+12t)(1)
Pela divisão inteira:
P(t+12t)=P(2−t+12)=2t−2log∣t+1∣
Como t=φ−1(x)=x:
P(x+11)=2x−2log(x+1)(2)
💡 Pode-se assim observar melhor a fórmula da primitivação por substituição mais facilmente. No passo (1), foi calculado P((f∘φ)⋅φ′), com uma mudança de variável. Se seguida, no passo (2), foi feita normalmente a mudança de variável, correspondente à composta por φ−1 na fórmula original.
Notação do Integral
Visto que se faz mudanças de variável, é usual utilizar a notação de integral, que indica qual é a a variável que se está a considerar.
Reescrevendo assim o exemplo acima, sendo dx=φ′(t)dt=2tdt,
Abaixo seguem-se algumas substituições "clássicas", isto é, algumas técnicas que são normalmente utilizadas. Neste caso, com raízes em que o radicando corresponde a uma função quadrática de x.
A escolha da substituição que contém o cosseno hiperbólico requer o conhecimento da fórmula da bisseção do cosseno hiperbólico.
Primitivas de raízes de polinómio do segundo grau
É, ainda, possível determinar primitivas de raízes de polinómios do segundo grau usando substituições meramente racionais e que transformam a primitiva dada numa primitiva de uma função racional.
Se α for uma raiz de ax2+bx+c, pode-se determinar
∫ax2+bx+cdx
Fazendo a substituição definida por ax2+bx+c=(x−α)t, a qual transforma a primitiva numa primitiva de uma função racional.
Caso o polinómio não tenha raízes, pode-se aplicar uma das seguintes substituições:
ax2+bx+c=ax+t,se a>0ouax2+bx+c=c+xt,se c>0
Exemplos
Os exemplos abaixo estão explicados em mais detalhe das páginas 5-11 do PDF da aula 23
Exemplo 1
∫xx+1dx
Considerando o seguinte (atendendo às condições da fórmula):
No caso abaixo, pretende-se obter uma função racional por substituição, e, por isso, faz-se a substituição por x=tm onde m é o mínimo múltiplo comum dos índices das raízes, com t>0, se m é par, para ter injetividade.
∫4−3x1+xdx
Neste caso, como o mínimo múltiplo comum entre 2 e 3 é 6, faz-se x=t6,t>0:
E agora é só finalizar pela Primitivação de Funções Racionais.
Exemplo 5
Existe outro caso em que a função a primitivar já tem o aspeto (f∘φ−1)⋅(φ−1)′.
∫x(log2x−1)logx+log2xdx
Onde logx=t e x1dx=dt.
Substituindo na primitiva:
∫log2x−1logx+log2x⋅x1dx=∫t2−1t+t2dt
E agora é só finalizar pela Primitivação de Funções Racionais.
Exemplo 6
Caso se pretenda primitivar uma função racional de senos e cossenos, isto é, uma fração em que quer o numerador quer o denominador são combinações lineares de potências do seno e do cosseno, a substituição definida por
tg2x=t
transforma a primitiva numa primitiva de função racional pois resulta em